Luci Collin

MESMAS COISAS
ao Manoel Carlos Karam                                                                    
por Luci Collin

e a história do meu coração itinerante      
que ora está desaviso
é simulação de tempo        e cura
dos lenços que não significam partir
e nem precisar da surpresa         do retorno

e a história do animal encarcerado
inaugura vocábulos e deixas       restaura blefes e empates
para que se vendam sortes e códigos
aos mais propensos a brincar com fogo
aos dados a esquecer frases      cadarços desamarrados
ordena-se que se percam
para que se faça valer a indicação        SAÍDA       do nada

e a história do bom ladrão      sempre esteve à venda
e a história do lobo em pele de gente
sempre abalaria os almanaques        e os gestos de fuga
que se completam cheios de ironia
na coleção de destinos              na coleção de desvarios mesmo

na coleção de insignificados     e de gritos     e de desvios
você no cais você na garupa da moto você deitando-se sobre os trilhos
você na janela no último andar
olhando as figuras apressadas ou recortando as figuras da revista ou
crendo ou                   acordando quando acaba o filme

a existência do fim é suprema festa
e dizer é orquestrar o orvalho
(desligaram o microfone apagaram as luzes apagaram as velas
mistério de empalhar o pássaro e o voo
inaugurando o bocejo                  do infinito)

a existência do fim é supremacia
e contar é inferir o que se perde
o fôlego
que (enganei um bobo!) se recupera
no mesmo instante             a graça volta
fazendo a vez de um destino
e a coleção que se estabelece
é mansa e de uma beleza         de guerrilha

a máxima fica sendo    arma     tinta   máscara       
(acorde          cinzel        derrame)
e vale a lentidão e dentro das camadas
de perfume e pele
a permissão de nostalgia e exercício
e eu escureço  e eu recupero e eu objetivo o antes e
ser mesmas coisas                    de um sempre
:
a emergência dos subúrbios          dos submarinos
saindo da foto     saindo do corpo      do verbete

como se o floreio e  a divisão das células
a divisão dos compassos  a multiplicação das nuvens

e a volta embutida na cena
é retomada                    nos faz cúmplices

porque o imenso está            perto
está pertíssimo e           a partir de agora
nos pertence.

Luci Collin, janeiro de 2017