Eleotério Burrego, livreiro

“Houvesse como voltar ao tempo, não ficaria eternamente reavaliando e repensando aqueles instantes debaixo de guarda-sóis verdes, sorvendo cerveja e conversando variedades como fazíamos as vezes na livraria.
Convidado por Paulo Sandrini, juntamente com Roberto Gomes para batermos um papinho com Karam que estava, julgava eu, à época, se recuperando ou estava debilitado devido a uma enfermidade, que no dia não dei importância, ou me falaram e não relevei.
Adorei, a cerveja ficou deliciosa, embora nunca tenha bebido e nem gosto de Heineken, e o motivo da visita se esvaeceu no meio de vários temas da conversa, que dava volteios e mais volteios, em torno de bolachas Maria, cebola e Taedos.
Estava com certa ansiedade em falar com nosso anfitrião a respeito de um certo trecho de texto que havia lido e na conversa insisti veementemente se ele não tinha dado continuidade a ele, se era um conto, começo de romance, pois havia ficado boquiaberto com a leitura. Percebi uma troca de olhares entre Sandrini e Karam, eles sabiam que minha ansiedade seria saciada em breve, já existia aquele livro, só não estava publicado, e que seria feito postumamente, e não tive como tecer opiniões e exultação com o autor. Livro magnífico.
Aquele barbudinho, com aquela sacola de couro a tiracolo e seu sorriso contagiante ficou pululando em meu imaginário, ontem e hoje ainda.
Em seus textos e no falar, Karam tinha uma mordacidade e profundidade, que de alguma forma você segura o riso, mas por dentro já está às mil gargalhadas com a engenhosidade com o que é lido ou ouvido.
Esses momentos ficaram como ponto de reflexão em minha alma, e foi numa manhã, em São Paulo que fiquei sabendo que o meu amigo havia partido; sempre converso com meus botões a respeito daquele amigo irreverente que me ocasionou em um instante, um adeus que não percebi.”
– Eleotério Burrego, livreiro